12 de março de 2010

Mistura na Winter

A Winter School (WS) representa o que há de diferente deste mestrado. Todo o mestrado tem disciplinas, tem dissertação pra escrever e tem estágio – seja ele académico, como lecionar uma disciplina (como acontece na UnB e acredito que em quase todas as Universidades brasileiras) ou prático, como trabalhar numa organização (como acontece no mestrado Erasmus Mundus). Nos mestrados Erasmus Mundus ainda temos a vantagem de conhecer pessoas que vieram dos mais variados cantos do planeta (mais do lado Ocidental, na verdade…). A WS é o momento onde todos os alunos europeus e não europeus (na nossa edição somos 34) espalhados entre as 5 Universidade do Latin cluster europeu (Coimbra, Barcelona, Valência, Bologna e Paris V) se misturam.

É como se bacalhau à bras, paella, risoto, cassoulet, feijoada, ajiaco e guacamole fossem servidos na mesma mesa. E todos tivessem que provar um pouquinho. Agora imagine se além de tudo isso viesse um rib steak pra arrematar o jantar? Pois é, se não bastasse todo mix de gente que faz parte do programa, o WOP-P sempre tenta se associar a alguma Universidade de fora do European latin cluster para apimentar a mistura. Neste ano, a San José State University presenteou a nossa WS com mais 8 alunos ao grupo de 34: totalizando 42 mestrandos. Quando decidi promover uma enquete para averiguar quantos desses 8 estudantes nasceram nas terras do tio Sam, descobri que seis alunos que moram e vieram representar o país liderado pelo aclamado e criticado Obama nasceram na India, Paquistão, México, Portugal e por aí vai… E dos 42 alunos que participaram da WS 2010, a minha enquete identificou 12 nacionalidades diferentes. Definitavemente a WS concretiza um dos aspectos que me fez sonhar sair do Brasil: conviver com a diversidade!

Em cada ano, a WS acontece numa cidade diferente do consórcio. Já foi em Bertinoro (representando Bologna), em Barcelona no ano passado e esse ano foi em… Coíiimbra! Quando eu soube que ela seria realizada aqui, minha primeira manifestaçaõ foi: “Ah não, que azar! Queria que fossem em Paris ou em Valência, pra poder conhecer melhor as cidades e as Universidades daquelas cidades onde passei, mas não estudei…” No meu discurso e imaginário daquele tempo não fui capaz de me dar conta de que aqui posso ser anfitriã. Talvez porque há muitos portugueses na turma e é claro que eu não conheço Coimbra tão bem quando eles (ó pá, longe de mim!) Mas a verdade é que uma mistura enorme de bons sentimentos me tomou conta quando me vi apresentando a Universidade de Coimbra, guiando até as cantinas, sugerindo um bom café, contando histórias que vivi naquelas ladeiras, mostrando minha nova morada! Emoção foi o tempero que dominou minha experiência ao apresentar essa doce cidade portuguesa a norte-americanos, franceses, espanhóis... Especialmente porque havia acabado de colocar os pés na cidade e a mão na massa. Todos sabem que fiquei em Barcelona até o último minuto. Cheguei em Coimbra um dia antes de começar a WS apenas pra ter tempo de desfazer as malas e comprar o café da manhã do dia seguinte. Ainda de ressaca das claras e cavas, minha chegada em Coimbra quase um ano depois tem sido uma boa pedida…

Os 42 alunos foram divididos em grupos de 4, 5 alunos que deveriam realizar uma infinidade de trabalhos relacionados a Psicologia dos Recursos Humanos. O meu grupo foi composto de duas brasileiras (eu e mais uma colega de Fortaleza que estuda em Valência), um africano (Ilha Maurício) que estuda em Paris e uma indiana que mora nos EUA desde os 15 anos e se considera tão estadunidense como indiana. Por respeito a eles não escreverei aqui sobre suas qualidades, o que fazem, como vivem. Mas deixo apenas uma pitada de idéia: é muito intrigante conviver com pessoas com trajetórias de vida tão divergentes da sua...

A Winter é composta por uma fase virtual e outra presencial. De novembro do ano passado a fevereiro desse ano trabalhamos virtualmente. Email, Skype e Gtalk foram nossas ferramentas de comunicação. E tínhamos que nos adaptar não apenas aos compromissos e rotinas de cada um, mas ao fuso que separa Espanha, França e EUA. A nossa empolgação do primeiro dia que nos vimos ao vivo em Coimbra foi inesquecível. E juntos tivemos duas semanas intensas de trabalho para terminar todos os projetos solicitados. Como na vida real de toda e qualquer organização, tive a oportunidade de trabalhar numa equipe que eu não escolhi, cujos membros nunca havia visto e que não sei quando os verei novamente.

Níveis de inglês diferenciados, sotaques também. Juntando isso ao fato de que a tecnologia nem sempre está a nosso favor, as nossas primeiras conversas via Skype tinham mais: "- Can you repeat, please? I can't listen to you!" do que conteúdo. Formas de trabalhar distintas, culturas também. Agir e cumprir prazos respeitando tudo isso. Eficiência, efetividade e eficácia começam a ter outro significado quando a equipe é diversa. Tem gente que enche o power point de texto, tem gente que quer que apenas tópicos e figuras. Alguns preferem entrar num consenso antes de começar a produzir, outros começam a produzir sem nem perguntar se um dos membros concorda. Alguns acham que fazer o que professor pede é mais que suficiente, outros querem ir além, muito mais além. Eu posso trabalhar de madrugada, tem gente que não. Eu não perco a hora do almoço e do jantar pra trabalhar, tem gente que sim. Como conciliar?

No final, a conclusão a qual cheguei é que manter a boa relação entre os membros do grupo representa o tempero mais importante para tornar essa mistura fina. Por conversas que tive com outros colegas, observamos que são poucos os que estão dispostos a ceder para manter as boas relações entre os colegas. E mais, sabemos que a diversidade gera conflito naturalmente e que para a resolução de problemas complexos esses conflitos são enriquecedores porque fomentam a criatividade e a inovação. Mas eu ainda defendo que o segredo da receita para chegar ao fim com trabalhos entregues e uma rede de contatos marcada por respeito e confiança, todos necessitam ceder alguma vez para que o jeito e as opniões de cada um sejam consideradas pelo menos algumas vezes para que todos percebam que agregaram seu toque pessoal ao prato principal.

Dessa experiência, espero levar para minha prática profissional muito conhecimento sobre ética e justiça no trabalho, promoção da diversidade nas equipes, gestão de conflitos e liderança carismática e transformacional. Da vivência com toda essa mistura de gente, jeito, cultura e cor, me sinto hoje mais brasileira, mais apaixonada e saudosa pela minha terra, música, povo e calor. Mas sigo sonhando por um mundo onde a diversidade não seja vista apenas como um fato, como resultado da globalização, mas como fruto dela e que impulsiona a geração de novas idéias, a valoração do ser e agir diferente e a construção de vínculos, laços e relações cheios de sabor.